13 de janeiro de 2024

Algumas histórias sobre os grandes carvalhos-cerquinhos em Portugal

 Um grupo de amigos entusiastas dos carvalhos em Portugal, em especial do carvalho-cerquinho (Quercus faginea Lam) tem nos últimos anos procurado conhecer melhor esta espécie, assim, como identificar onde estão localizados os maiores carvalhos e quais as suas histórias. O objetivo é contribuir para a proteção, preservação e valorização social dos carvalhos cerquinhos centenários e singulares em Portugal.

Carvalhos de Tomar identificados no artigo da revista Lucanus: Carvalho da Pedreira (A); Carvalho do Pintado na EN110 (B); Carvalho “Jorge Paiva” no jardim da Biblioteca de Tomar (C); Carvalho do Pinhal de Santa Barbara em Tomar (D); Carvalho de Santa Barbara (E); Carvalho de Carregueiros na EN113 (F)

Foram publicados até ao momento dois trabalhos sobre os carvalhos-cerquinhos com alguns dos resultados dessas pesquisas. O primeiro em português, foi publicado em 2020 na revista Lucanus, editada pelo município de Lousada, e tem como título “Carvalhos-Cerquinhos de grande porte dos Concelhos da Batalha e de Tomar como embaixadores dos bosques de Quercus faginea Lam. (Cercais) na Zona Centro de Portugal”.

Este artigo surgiu da necessidade de resumir e apresentar alguns dos resultados do trabalho de inventariação desenvolvido nos municípios da Batalha e Tomar, os primeiros locais, onde foi iniciada esta pesquisa.  

Foram identificados cerca de 12 carvalhos no município da Batalha e 6 carvalhos no município de Tomar com um porte superior a 2,5 metros de perímetro à altura do peito (PAP). 

Desta lista, por iniciativa da associação 30POR1LINHA, já foram classificados três carvalhos no município de Tomar como árvores de interesse público. O carvalho da Pedreira na margem do rio Nabão, o carvalho “Jorge Paiva” no jardim da biblioteca de Tomar e o carvalho de Carregueiros na EN113.

O artigo é de acesso livre e encontra-se disponível na seguinte ligação:

https://www.researchgate.net/publication/346447337_Carvalhos-Cerquinhos_de_grande_porte_dos_Concelhos_da_Batalha_e_de_Tomar_como_embaixadores_dos_bosques_de_Quercus_faginea_Lam_Cercais_na_Zona_Centro_de_Portugal

Da necessidade de divulgar internacionalmente os resultados obtidos em Tomar e na Batalha, em 2022 foi publicado em inglês um outro artigo intitulado “Old Growth Quercus faginea in Portugal”. O artigo surgiu na revista International Oaks nº 33 editada pela International Oak Society (IOS), uma organização com membros de todo o mundo, cuja missão é o aprofundamento do estudo, a gestão sustentável, preservação, valorização e disseminação do conhecimento do género Quercus e ecossistemas associados.

Além dos municípios da Batalha e Tomar, neste trabalho é incluído o município de Alcobaça, assim como algumas notas sobre a presença desta espécie de carvalho no Alentejo. 

Neste trabalho, destacam-se por exemplo, o carvalho do “Padre Zé”, na Batalha, provavelmente o maior carvalho-cerquinho existente em Portugal, com uma história notável de sobrevivência no período da 2ª Guerra Mundial. 

 

Carvalho do padre Zé localizado no Reguengo do Fetal (Batalha)

Também o carvalho “Jorge Paiva”, em Tomar, merece destaque, já que para além do seu tamanho imponente, homenageia um distinto botânico português.

 

 Carvalho Jorge Paiva localizado no jardim da biblioteca de Tomar classificado de interesse público

Uma nota de destaque para o bosque de carvalho-cerquinho na Mata Nacional do Vimeiro em Alcobaça, onde Joaquim Vieira Natividade em 1929, realizou a sua tese para obtenção do grau de engenheiro florestal.  Ainda em evidência, é apresentado um mapa de distribuição potencial da espécie em Portugal, ou seja, um mapa que delimita as zonas ótimas de solo e clima onde a espécie tem condições adequadas de crescimento e formar habitats. Este mapa baseia-se nos trabalhos de investigação sobre os carvalhos na Península Ibérica, desenvolvidos nos últimos anos por Carlos Vila-Viçosa, botânico português que nos últimos anos tem dedicado a sua carreira à investigação do género Quercus em Portugal. 

O artigo é de acesso livre e encontra-se disponível na seguinte ligação:

https://www.researchgate.net/publication/361503906_OldGrowth_Quercus_faginea_in_Portugal

A procura e descoberta destes grandes carvalhos-cerquinhos centenários e singulares e das suas histórias continua. Muitos mais carvalhos existem, alguns mais ou menos conhecidos, outros mais anónimos, sobretudo nos municípios do Centro Oeste português.  Já foram identificados mais exemplares de grande porte nos concelhos de Alcanena, Alvaiazere, Ansião, Ferreira do Zêzere, Leiria, Ourém, Porto de Mós, Rio Maior e Torres Novas, todos com atributos de serem classificados de interesse público e que poderão ser consultados em : https://www.monumentaltrees.com/en/prt-quercusfaginea/

Mais recentemente, os holofotes viram se para Rio Maior, onde os carvalhos e sobreiros, que constituem o túnel arbóreo na estrada nacional (EN) 114 junto à localidade da Senhora da Luz, se encontram ameaçados para abate, por ordem na empresa publica Infraestruturas de Portugal (IP).

As razões para a ordem de abate não foram devidamente justificadas publicamente pela IP. Num troço de cerca de 2000 metros entre os quilómetros 42 e 43, o arvoredo existente na berma da estrada é constituído maioritariamente pelo carvalho-cerquinho e sobreiro, sendo um conjunto de inegável valor ecológico, estético e paisagístico. 

 

O túnel arbóreo da Senhora da Luz localiza-se entre o km 42 e 43 da EN114

Algumas destas árvores são de grande porte e centenárias. O abate indiscriminado destas árvores sem a devida justificação técnica será uma perda irreparável. Pois “não se plantam árvores com cem anos”.

Entretanto, o caso do túnel arbóreo da Senhora da Luz da EN 114 já teve repercussão internacional com uma publicação na página web da International Oak Society (IOS), intitulado Ancient Oaks Need Safeguarding in Portugal disponivel em:

https://www.internationaloaksociety.org/content/ancient-oaks-need-safeguarding-portugal

Para conhecer melhor este o património arbóreo do túnel da Senhora da Luz e para uma perspetiva mais correta da monumentalidade destas árvores, foi realizado um levantamento de alguns dados dendrométricos de cerca de 41 carvalhos e sobreiros. Assim, relativamente aos dados de perímetro de peito (PAP) e de perímetro de base (PB), dos 31 carvalhos medidos, foram identificados 9 carvalhos com atributos para serem classificados como de interesse público pelo critério do porte, isto é, 29 % do conjunto amostrado.

 

Túnel arbóreo constituído por carvalhos e sobreiros na EN114 no concelho de Rio Maior 

Além do valor ecológico e paisagístico, este arvoredo ao longo dos anos tem sequestrado dezenas de toneladas de dióxido de carbono, sendo que a preservação destas árvores de grande porte, é uma medida que contribuirá numa escala local para a mitigação das alterações climáticas.

A divulgação publica e pressão sobre as entidades competentes neste caso do túnel arbóreo da Senhora da Luz em Rio Maior é uma esperança para a salvaguarda deste património, que chegou até aos dias de hoje como resquício de uma floresta nativa secular que praticamente desapareceu do nosso território.

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