12 de março de 2025

Em Defesa da Floresta Portuguesa - Problemas e Soluções

Com o objetivo de "estimular o debate público sobre os problemas sistémicos da floresta portuguesa, apontando aquelas que nos parecem ser as três grandes prioridades a ter em conta para conseguir uma gestão verdadeiramente sustentável", Faixas Vivas, MUDA e Acréscimo lançaram a Carta aberta Em Defesa da Floresta Portuguesa - Problemas e Soluções.


CARTA ABERTA EM DEFESA DA FLORESTA PORTUGUESA - PROBLEMAS E SOLUÇÕES


À conversão de áreas de floresta em áreas urbanas, turísticas ou industriais, têm vindo a somar-se sucessivas pressões, desde a construção de novas infraestruturas (ex: rede elétrica, autoestradas e barragens), implementação de grandes faixas abertas de corte e gestão de combustível, propagação de grandes incêndios, prática generalizada de gradagem junto às árvores, e o uso e abuso de cortes rasos que, devido à ausência de fiscalização sobre as autorizações de corte, proliferam impunemente perante a lei, inclusivamente dentro das áreas protegidas do Sistema Nacional de Áreas Classificadas (SNAC).

Com esta carta pretendemos estimular o debate público sobre os problemas sistémicos da floresta portuguesa, apontando aquelas que nos parecem ser as três grandes prioridades a ter em conta para conseguir uma gestão verdadeiramente sustentável, explorando quais os fatores que atualmente puxam pela sua degradação, e propondo soluções de fundo.

1 - Fiscalizar, rever a lei e gerir a paisagem

Face aos sucessivos casos de abates abusivos em espaço público e privado, assinalamos a urgência do aumento de meios e poder de fiscalização do ICNF e GNR, a par da revisão da lei de corte (Decreto-Lei nº 31/2020), como passos essenciais para a consolidação de uma verdadeira proteção física e jurídica das árvores e florestas no nosso país.

No que diz respeito às normas aplicáveis às Faixas de Gestão de Combustível (FGC), defendemos a sua revisão e uma consulta pública prévia à aplicação no terreno do novo regulamento (Decreto-Lei nº 82/2021). Apesar de essa aplicação ser apontada para 2025, sociedade civil, associações do setor florestal, ONGA e a academia não foram ouvidas, tendo elas elementos para melhorar as diretrizes de uma forma abrangente e construtiva, neste que é um regulamento estruturante para o desenvolvimento do nosso território.

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2 - Dar novo rumo à produção florestal

A indústria da madeira de pinho estará a consumir anualmente à volta de 4 milhões de m3 de rolaria descascada, sendo mais valorizada a madeira verde de “corte final” (também designado “corte raso”), com valores de mercado entre os 35 a 45€ por tonelada. Deste total, 20% estarão a ser destinados à produção de pellets, 5% diretamente para centrais a biomassa, e os restantes 75% para fabricação de postes e varas tratadas, serração, painéis de madeira e papel de embalagem. 

Olhando para o setor energético vemos que atualmente existem já 23 centrais termoelétricas a biomassa e 26 fábricas de transformação de pellets amplamente distribuídas pelo território, e que estarão a consumir desta madeira. Segundo os dados oficiais, as centrais estarão neste momento a utilizar cerca de 45% de resíduos agrícolas e florestais na sua produção de eletricidade e calor (seja dedicada ou em cogeração), e no consumo doméstico e de serviços esta utilização de resíduos estará já próxima dos 55%, sendo considerada uma fonte de energia renovável. Porém, admitamos que o seu processo de produção e queima não é nem mais limpo nem se baseia numa matéria-prima que tenha a renovação rápida o suficiente para ser verdadeiramente sustentável, e desse ponto de vista é preocupante constatarmos que em 2022 esta fonte chegou a representar 47% do total de energia consumida em Portugal (33% térmica + 14% elétrica). 

Também em 2022, as 6 maiores fábricas de produção de pellets no país (situadas na região Centro, e com uma capacidade total instalada superior a 760 mil ton/ano) exigiram um consumo de 1,4 milhões de toneladas de madeira, da qual 75% de rolaria e apenas 25% de fontes secundárias (ex: sobrantes agrícolas e florestais ou subprodutos de serração). Sendo que, apesar de estas empresas afirmarem que apenas utilizam biomassa residual, a totalidade dos sobrantes estará na realidade a ser utilizada apenas como combustível no processo de secagem da estilha produzida a partir da rolaria e não como matéria-prima para os pellets

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3 - Inverter fatores de degradação

É com base em todo o cenário descrito nos capítulos anteriores, que recebemos com grande consternação as declarações recentes da Sra. Ministra da Energia e Ambiente, Maria da Graça Carvalho, no final da conferência “Portugal Renewables Summit” da APREN[1], afirmando que o seu ministério está neste momento a “preparar novos projetos relacionados com a biomassa, com um grande foco no aproveitamento das ‘limpezas’ das áreas florestais”, “tendo como princípio não ter tarifas garantidas” mas admitindo que em algumas situações irá continuar a “auxiliar, remunerando os serviços que são prestados à sociedade e ecossistemas florestais”, pesando sempre “o benefício que essa central produz em relação à floresta e sua ’limpeza’”. 

A estas juntam-se as declarações do Sr. Diretor-Geral da CBN - Centrais de Biomassa do Norte Lda., Manuel Pitrez de Barros, reforçando numa entrevista que[2]:
- “É urgente promover uma política sustentável para a floresta nacional com a criação de mais centrais de biomassa que, para além de criarem postos de trabalho, promovem a economia local circular, especialmente em zonas rurais”;
- “Com uma estratégia pensada em conjunto com os privados, a devida regulamentação e supervisão, a exploração florestal possa passar dos 0,48% para 1-2% do PIB, ou, contando com as indústrias transformadoras da biomassa, como as celuloses, chegar a mais de 10% do PIB”;
- “70% da faturação das centrais de biomassa reverte totalmente para a economia local, não havendo mais nenhuma fonte de energia, renovável ou não, que tenha um impacto sócio-económico tão significativo”;

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4 - Alinhamento das nossas propostas com estratégias e planos nacionais

Estas propostas visam evidenciar os esforços desenvolvidos por diversos projetos públicos e privados, e como no seu conjunto podem ser úteis para complementar e potenciar os esforços do governo português. Alinhando as suas políticas internas com as melhores práticas e os vários objetivos, estratégias e planos europeus e internacionais, o governo português poderá responder com maior eficácia às necessidades de gestão interna mais urgentes (ex: prevenção de incêndios e cheias, perda de solo fértil e biodiversidade, despovoamento do interior e alta pressão no litoral, e todos os custos financeiros e estruturais que estes fenómenos acarretam para o erário público) ao mesmo tempo que dá o seu contributo para as causas comuns da comunidade internacional e solidifica a sua posição como uma referência na transição para uma bioeconomia limpa e circular. 

Nesse sentido, pensamos que as nossas propostas se enquadram e poderão contribuir de forma significativa para o cumprimento das várias metas com que o país já está comprometido, como:
- Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ONU);
- Década da Restauração dos Ecossistemas 2020-2030 (ONU);
- Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030 (PT);
- Lei Anti-Desflorestação (UE);
- Lei do Restauro da Natureza (UE);
- Plano Nacional de Restauro da Natureza (PT);
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Texto integral e subscrição da carta em Carta aberta

6 de fevereiro de 2025

Abates na EN 243

A IP persiste na destruição do arvoredo das bermas das estradas, como se fossem sua propriedade. 

 
Com o  pretexto de "trabalhos de limpeza de combustível", na EN 243, entre a Chamusca e o Chouto, cerca de 20 árvores - choupos brancos, plátanos e pinheiros mansos, com dimensões consideráveis, foram abatidas com o argumento da prevenção de incêndios.

As canas ficaram, no entender da IP não são combustível...

2 de fevereiro de 2025

O presidente da IP no Parlamento

O Presidente do Conselho de Administração da Infraestruturas de Portugal foi ouvido no passado dia 22 de janeiro,  na Comissão de Ambiente e Energia da Assembleia da Republica, sobre o abate de árvores e a venda da madeira. A gravação da audição está disponível no Canal Parlamento.

Como era de esperar, para a IP está tudo bem, "não há práticas desreguladas ou cortes abusivos", a empresa rege-se por princípios de sustentabilidade. 

Sem contraditório, o responsável máximo da IP fez as afirmações que entendeu, imprecisas ou de natureza duvidosa, assinalamos algumas:

- As árvores que acompanham os 14.000 km da rodovia sobre gestão da IP são individualmente identificadas, quanto ao estado e risco potencial, por equipas da IP (min. 14). Tarefa aparentemente hercúlea, não fosse o método rápido da IP, aplicado por exemplo na EN 362,  onde,  dois técnicos da IP, em apenas um dia  vistoriaram e avaliaram as árvores de um troço de 30 km de estrada, concluindo pela necessidade de cortar 120 árvores. Uma produtividade que nos faz questionar o seu rigor e fundamento técnico. (ver relatório de vistoria)

- Medidas de compensação - só nos últimos 2 anos plantaram mais que 5.000 árvores (min. 15). E quantas terão cortado? Qual o rácio ecologicamente aceitável para a substituição de uma árvore adulta? Plantam, e depois? Veja-se o caso da plantação na Sra. da Luz que fala por si, ou, da  EN 361, em Alcanena, onde o Estudo de Impacto Ambiental impôs a plantação de diversas áreas de espécies autóctones, que após a plantação ficaram votadas ao abandono.

- A mutilação azinheira monumental Outeiro de Alfazema. Diz o responsável que apenas se fez a poda de uma árvore para aumentar o gabari vertical (12.45 min.) Admitamos a ignorância: a altura a que se situavam os ramos não poderiam, nunca, interferir com o trânsito, o madeireiro que realizou o trabalho não tinha competência para o fazer e a IP não acautelou a qualidade da intervenção.

- A IP não vende a madeira resultante dos abates.  Não ganha dinheiro com ela, dá-o a ganhar aos operadores! (37min.)

Enquanto isto a IP continua impunemente a delapidação do nosso património arbóreo.

28 de janeiro de 2025

Ambiente e desilusão

“Neste momento não tenho esperança nenhuma”, é a desilusão afirmada pelo Prof. Jorge Paiva, após mais de meio século de atividade cívica em prol do Ambiente e da Natureza.

O seu postal de Natal de 2024, “Ambiente e Desilusão”, reflexo desta descrença, foi um dos motes para a entrevista que deu recentemente à rádio TSF.

À questão da jornalista: “Neste postal diz que foi uma “luta improfícua”; cita Camões, dizendo que, se ele foi um “valoroso lírico”, o Jorge Paiva foi um “lírico irrealista” e que o seu “desalento é enorme”. É um homem sem esperança, no que respeita ao Ambiente e a salvação do Ambiente?” O professor responde com a constatação da ignorância manifesta dos políticos pelos problemas ambientais, que considera inconcebível atendendo a estarmos em “plena alteração climática muito grave” e a quem acusa de “não fazem absolutamente nada”.

Transportemos a reflexão do Prof. Jorge Paiva para o nível local, o nível das nossas pequenas intervenções. Veja-se a prática de empresas tuteladas pelo Estado, como a Infraestruturas de Portugal, com o abate indiscriminado de milhares de árvores, centenas, só na EN114, entre Santarém e Rio Maior; veja-se a atuação do organismo público responsável pela conservação da natureza e das florestas, o ICNF, que de forma cúmplice, ignorando a lei e a sua obrigação de prestação de contas aos cidadãos, faz de morto perante sucessivos pedidos de informação e de intervenção.

 Estamos certos de que não será a presença das árvores nas bermas das estradas que irá salvar o mundo, mas, talvez de uma forma “lírica e irrealista”, acreditamos que a correta gestão do arvoredo nas bermas das estradas poderá contribuir localmente para mitigar alguns dos efeitos nefastos associados à alteração climática do planeta. Mais que não fosse elas alegram-nos as paisagens. 

20 de janeiro de 2025

Sob as linhas elétricas como nas bermas das estradas

E-Redes compete com a Infraestruturas de Portugal a ver qual das empresas causa mais estragos.

Em Fátima uma área de floresta autóctone, composta por azinheiras e sobreiros, está marcada para abate devido à implementação de faixas de gestão de combustíveis sob linhas de média tensão.

Independentemente de se tratar espécies protegidas, da sua resiliência ao fogo e da sua importância ecológica, a empresa E-Redes pretende o seu corte raso como tem feito em centena de hectares por todo o país.

O grupo Faixas Vivas denúncia este previsível atentado enquanto tenta levar a empresa a assumir uma gestão ecologicamente responsável, intervindo apenas no sub-bosque e removendo só os ramos que representem perigo real para a linha elétrica.

https://www.facebook.com/faixasvivas?locale=pt_PT

17 de janeiro de 2025

O Túnel da Sra. da Luz no Faixas Vivas

O  grupo Faixas Vivas, fez-se eco das nossas preocupações com a preservação do património do Túnel Arbóreo da Sra. da Luz.

Faixas Vivas é uma iniciativa colaborativa que une várias organizações não governamentais, empresas e indivíduos comprometidos com a criação de um futuro mais sustentável, centrados na reforma ecológica do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais.

Face aos abates injustificados de arvoredo que, a coberto da proteção contra incêndios, têm ocorrido por todo o país, Faixas Vivas disponibiliza no seu site um formulário para denúncia dessas situações abusivas.

29 de novembro de 2024

Por onde anda o Guia de Boas Práticas para a Gestão do arvoredo Urbano do ICNF ?

Em agosto de 2021 a Assembleia da República aprovou o Regime jurídico de gestão do arvoredo urbano, a lei n.º 59/2021, um documento que regula as operações de poda, os transplantes e os abates no respeitante ao arvoredo urbano municipal e ao património arbóreo do Estado.

Esta lei previa que um Guia de Boas Práticas para a Gestão do Arvoredo Urbano,  seria aprovado pelo governo  no prazo de seis meses, mediante proposta do ICNF, e, que cada município deveria concluir, no prazo de um ano, o seu Regulamento de Gestão do Arvoredo em Meio Urbano, tendo como referência esse guia.

Há precisamente um ano, em carta dirigida ao Presidente do ICNF,  Folhas Erguidas constatava que este instituto, ao não ter ainda publicado o citado guia, estava há “um ano e nove meses sem cumprir a lei e a “impedir” que os municípios elaborem os seus regulamentos !”. Um ano volvido, a situação mantem-se. De acordo com nota constante do relatório da Assembleia da República relativo às leis cuja regulamentação ainda não tenha sido aprovada, (pg. 103, nota 662), em dezembro de 2023 o guia já teria sido elaborado pelo ICNF, “mas por algum motivo desconhecido, ainda não foi publicado ou enviado para a assembleia da república.”

Entretanto os municípios têm vindo a elaborar e a publicar os seus regulamentos de arvoredo urbano, conforme a sensibilidade política dos seus autarcas e a disponibilidade e capacidade técnica dos serviços. Numa breve consulta dos regulamentos, em discussão pública e/ou publicados, identificamos pelo menos sete – Almada, Amarante, Castelo Branco, Covilhã, Montemor-o-Novo, Pombal e Soure, que se reportam ao Guia de Boas Práticas, tendo-o como referencial de boas práticas, como fonte de critérios para a execução de operações técnicas e, até, disponibilizando-o como anexo ao seu regulamento.

2000 dias após a publicação de uma lei - de 18.8.2021 a 30.11.2024 -  continuamos a aguardar que o poder político se decida a cumpri-la.

25 de novembro de 2024

Pedido de classificação do Túnel Arbóreo da Sra. da Luz

Atendendo ao disposto no Regulamento de Gestão do Arvoredo do Município de Rio Maior, dada a excecionalidade do Túnel Arbóreo da Sra. da Luz e o risco constante de que a IP, à imagem da razia que levou a cabo no troço Rio Maior - Santarém, venha a concretizar as suas intenções, já manifestas nas marcações que fez nessas árvores.

De modo a colocar em prática o espírito do regulamento municipal e de preservar e dar a conhecer este conjunto este arbóreo de inegável valor patrimonial, constituído por várias dezenas de carvalhos cerquinhos (Quercus faginea) e sobreiros (Quercus suber) de grande porte, o Grupo de Trabalho Folhas Erguidas propôs a classificação municipal de 16 dessas árvores, com perímetros à altura do peito superiores a 2,5 m – 9 carvalhos (Q. faginea) e 7 sobreiros (Q. suber) – localizados entre o km 42,3 e km 43,4 da EN 114.